EGP Entrevista: Indicadores em Gestão Pública

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A adequada definição de indicadores é um requisito primordial para uma boa gestão. Qual a importância desse assunto para a Governança e Gestão por resultados na administração pública? Existem bons exemplos da gestão de indicadores em estados e municípios brasileiros? Para tratar dessas e de outras questões, o Ementário de hoje convida o professor e mestre em Administração Pública (FGV-Ebape), Weskley Rodrigues, e Rafael Mota, professor e Analista Administrativo da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) – para uma entrevista especial. Ao final, uma valiosa sugestão de curadoria de conteúdos para quem quiser se aprofundar no tema.

A organização do trabalho foi feita pelo prezado Eduardo Paracêncio.

 

Rafael Mota- “Não se gerencia o que não se mede, não se mede o que não se define, não se define o que não se entende, e não há sucesso no que não se gerencia”. Essa famosa frase, dita por William Deming em 1950, está presente em quase todos os livros de gestão utilizados na academia, e ainda assim eu tenho a percepção de que não damos a devida importância aos indicadores na gestão pública brasileira. Você poderia nos explicar o que são indicadores e como eles exercem influência sobre a gestão?

Weskley Rodrigues- Em sua essência, os indicadores funcionam como o painel de controle de uma organização, fornecendo informações essenciais que ajudam os gestores a ajustar suas ações de forma estratégica, garantindo que a operação se mantenha no rumo certo. Assim como um piloto precisa de diversos instrumentos para monitorar a altitude, velocidade, combustível e direção para um voo seguro, os gestores precisam de indicadores que abrangem diversas áreas-chave da organização.

Esses indicadores permitem acompanhar tanto o desempenho financeiro quanto os fatores operacionais que impulsionam as atividades para o futuro desejado. Kaplan e Norton[1] propõem uma abordagem de múltiplas perspectivas no Balanced Scorecard, que integra não apenas medidas financeiras, mas também indicadores de satisfação do cliente, processos internos e capacidade de inovação e aprendizado.

Dessa forma, a organização não se torna dependente de uma única dimensão do desempenho, como as métricas financeiras. Por exemplo, indicadores como o tempo de ciclo e a taxa de defeitos no setor operacional podem ser essenciais para o sucesso de longo prazo, promovendo melhorias na qualidade e eficiência.

Considerando o exemplo de um hospital público, se o objetivo for reduzir o tempo de espera dos pacientes, um indicador adequado seria o tempo médio de espera na emergência. Este indicador ajuda os gestores a entender se os recursos e processos estão alinhados para atender as demandas de forma eficiente.

Assim, os gestores de saúde devem adotar uma visão equilibrada, acompanhando indicadores que reflitam não só a eficiência no atendimento, mas também a qualidade do serviço e a inovação nos processos de tratamento e diagnóstico, garantindo que a organização avance em todas essas áreas para entregar valor à sociedade.

Um ponto crucial trazido por Kaplan e Norton é a proteção contra a subotimização. A utilização de um conjunto balanceado de indicadores evita que a melhoria em uma área comprometa outra. Por exemplo, ao reduzir o tempo de espera, é preciso cuidar para que a qualidade do atendimento não caia. Por meio do Balanced Scorecard, o gestor tem uma visão do todo, assegurando que as ações em prol da eficiência não prejudiquem a satisfação do usuário do serviço ou os processos internos de qualidade.

Assim, ter um conjunto de indicadores de desempenho se torna uma ferramenta poderosa para orientar a organização, permitindo uma visão ampla e integrativa que apoia a melhoria contínua e a inovação, essenciais para atender às necessidades do ambiente competitivo e dinâmico atual.

RM- Fala-se muito sobre metas e pouco sobre indicadores. Existe alguma relação entre essas ferramentas de gestão?

WR- Sim, metas e indicadores têm uma relação essencial e inseparável, semelhante à de uma fábrica de café da manhã bem estruturada. Imagine que você é o gestor de uma fábrica de café da manhã que produz torradas, café e ovos cozidos. A meta da sua operação pode ser servir mil cafés da manhã por dia com um alto nível de satisfação dos clientes. Mas como você sabe se está no caminho certo para atingir essa meta? É aí que entram os indicadores.

Os indicadores atuam como as métricas diárias que você acompanha para garantir que suas metas de produção e qualidade sejam alcançadas. Para isso, você pode usar indicadores como a projeção de vendas, o estoque de matérias-primas, o estado dos equipamentos, a mão de obra disponível e o feedback dos clientes sobre a qualidade. Esses indicadores ajudam a ajustar suas operações, verificando, por exemplo, se há café suficiente para o dia ou se algum equipamento está com defeito e precisa de manutenção.

Assim, enquanto a meta representa “onde queremos chegar” — como produzir mil cafés da manhã —, os indicadores são as ferramentas que mostram se estamos avançando no caminho certo, permitindo ajustar a rota. Eles medem o que precisa ser monitorado para que você possa alcançar suas metas com eficiência, como o nível de satisfação dos clientes ou a variabilidade entre o número planejado e o número real de cafés da manhã entregues.

Além disso, os indicadores direcionam sua atenção para o que é essencial. Se você monitora meticulosamente o nível de estoque de ovos e pães, é provável que tome decisões para manter um estoque eficiente, sem excesso nem escassez. Esse equilíbrio é essencial, pois ajuda a evitar problemas de falta de produtos ou de desperdício, ajustando sua operação de acordo com a demanda e mantendo o foco nas metas de produção e satisfação dos clientes.

Dessa forma, os indicadores não apenas apoiam o alcance das metas, mas também fornecem insights para otimizar o processo, ajustando recursos e estratégias para que as metas sejam atingidas de forma sustentável e eficaz[2].

RM- Captamos uma enormidade de dados diariamente, mas pouco os utilizamos. De acordo com a consultoria Gartner, cerca de 97% dos dados não são utilizados pelas organizações. A que você atribui essa discrepância entre a captação e a efetiva utilização?

WR- A diferença entre o que é coletado e o que é realmente usado de dados nas organizações acontece porque, muitas vezes, elas não adaptam bem sua estrutura e cultura para aproveitar essas informações. De acordo com Tushman e O’Reilly (1996)[3], as chamadas “organizações ambidestras” são aquelas que conseguem equilibrar duas coisas importantes: a eficiência nas operações e a capacidade de inovar. Essas organizações criam sistemas que permitem conectar e usar os dados de maneira mais inteligente, enquanto outras, menos flexíveis, acabam não aproveitando bem essas informações.

No setor público, essa situação é ainda mais complicada pela falta de integração entre sistemas de coleta de dados e pela ausência de uma cultura focada em análise entre os gestores. Coletar dados sem um sistema que os organize e os torne acessíveis para decisões práticas é como ter uma biblioteca cheia de livros, mas sem qualquer organização. Assim, fica difícil encontrar o “livro” certo (ou seja, o dado necessário) quando é preciso.

As organizações ambidestras se destacam porque conseguem dividir o foco em duas partes: uma área voltada para inovação e análise dos dados e outra para garantir a eficiência das operações. Com isso, elas usam os dados tanto no dia a dia quanto em decisões estratégicas de longo prazo. Por outro lado, organizações que não conseguem unir essas duas frentes acabam acumulando dados sem conseguir transformá-los em valor prático e estratégico.

RM- Sabemos que as políticas públicas são criadas para resolver problemas na sociedade, para proporcionar melhorias progressivas na qualidade de vida das pessoas. No entanto, percebo que muitas dessas políticas públicas são criadas, passam a gerar custos, mas pouco se acompanha a geração de resultados ao longo do tempo. Você acredita que o uso de indicadores poderia ajudar a termos políticas públicas mais efetivas?

WR- Sim, o uso de indicadores é como um farol que orienta o caminho para políticas públicas mais eficazes. Eles permitem que os gestores monitorem o impacto das políticas e façam ajustes conforme necessário, garantindo que a gestão pública esteja sempre alinhada aos objetivos da sociedade.

Por exemplo, se uma política pública visa reduzir o índice de criminalidade em uma região, indicadores como o número de ocorrências policiais e o índice de reincidência criminal permitem monitorar os efeitos das ações implementadas. Quando indicadores bem aplicados, os indicadores permitem ajustes em tempo real, aumentando a efetividade das políticas públicas.

Ressalta-se a inclusão, no ano de 2021, do §16 no artigo 37 da Constituição Federal[4] que determina que os órgãos e entidades da administração pública realizem a avaliação das políticas públicas sob sua responsabilidade, com divulgação transparente tanto do objeto a ser avaliado quanto dos resultados alcançados.

Essa obrigatoriedade traz um avanço na governança pública, pois garante que a avaliação das políticas públicas seja uma prática institucionalizada, promovendo a prestação de contas à sociedade.

Nesse contexto, a utilização de indicadores de desempenho é essencial para facilitar o processo avaliativo, permitindo que se verifique critérios como eficiência, economicidade, eficácia e efetividade das políticas. Esses indicadores possibilitam uma análise mais objetiva e contínua dos resultados, ajudando a direcionar ajustes necessários para alcançar o impacto social desejado e garantindo que os recursos públicos sejam utilizados de forma responsável e orientada para resultados mensuráveis.

RM- Qual a sua percepção sobre a maturidade no uso de dados pelos gestores públicos? Conhece alguma pesquisa que tenha tratado sobre o tema?

WR- A maturidade no uso de dados pelos gestores públicos varia amplamente entre instituições e países, influenciada por fatores como infraestrutura, cultura organizacional e governança de dados. De acordo com o relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)[5], enquanto algumas organizações já alcançaram um nível avançado de utilização de dados, outras ainda enfrentam dificuldades significativas. Essa disparidade é observada especialmente entre órgãos federais, que geralmente têm mais recursos, e administrações locais menores, que carecem de infraestrutura e capacitação adequadas para a coleta e análise de dados.

O estudo da OCDE ressalta que, para avançar na maturidade dos dados, é necessário adotar uma abordagem de governança robusta, que inclua liderança clara, normas de interoperabilidade e padronização de dados, além de infraestrutura de TI que permita o compartilhamento e a reutilização de informações. A OCDE sugere um modelo de governança de dados dividido em três camadas: a estratégica, que envolve liderança e visão; a tática, focada em capacidades e regulamentação; e a operacional, que cobre a infraestrutura e a arquitetura de dados.

Entre os benefícios de uma governança de dados eficaz estão a possibilidade de melhorar a eficiência administrativa, garantir a transparência e fomentar a confiança do público no uso ético de suas informações. Países que adotaram práticas de compartilhamento de dados em tempo real, como na análise de políticas públicas ou serviços de saúde, demonstraram avanços significativos na geração de valor público. Essa abordagem permite que governos antecipem demandas sociais, avaliem o impacto de políticas e se adaptem rapidamente às necessidades emergentes da sociedade.

A OCDE também aponta que um dos desafios mais relevantes é a resistência à transformação cultural necessária para incorporar o uso estratégico de dados. Em muitos casos, os dados ainda são vistos como uma responsabilidade exclusiva do departamento de TI, quando deveriam ser uma prioridade em toda a administração pública. Para alcançar uma maturidade elevada, é fundamental capacitar os servidores públicos e desenvolver uma cultura organizacional que valorize a tomada de decisão baseada em evidências.

Essas constatações indicam que, embora o caminho para um setor público orientado por dados seja promissor, ele exige esforços coordenados e contínuos para superar barreiras técnicas, culturais e institucionais.

RM- Existem projetos em andamento, como o Painel de Monitoramento do Governo Federal, que buscam melhorar a gestão de dados. Você acha que esses programas estão no caminho certo?

Sim, programas de monitoramento e gestão de dados, como o Painel de Monitoramento do Governo Federal, estão no caminho certo ao buscarem melhorar a governança de dados e promover uma gestão pública mais transparente e eficiente. A iniciativa do InfoGov[6], plataforma lançada pela Escola Nacional de Administração Pública (Enap), ilustra bem esse avanço no uso de dados governamentais.

O InfoGov é uma plataforma online que integra diversas bases de dados do governo em um único ambiente acessível ao cidadão e aos gestores públicos. A plataforma foi desenvolvida com o objetivo de melhorar a “legibilidade” do Estado, ou seja, facilitar a compreensão de informações governamentais pela sociedade. Com uma interface amigável, o InfoGov permite que qualquer cidadão ou gestor visualize e analise dados sobre pessoal, compras, serviços e transferências voluntárias, entre outros temas, de maneira simplificada. A possibilidade de cada usuário simular suas próprias pesquisas e personalizar o ambiente para salvar análises e histórias de dados (“data stories”) torna essa plataforma uma ferramenta poderosa para a gestão pública e a transparência.

O InfoGov integra bases de dados governamentais de sistemas estruturantes dos sistemas estruturadores como, por exemplo, Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal (Sipec), Sistema de Organização e Inovação Institucional (Siorg), Sistema de Gestão de Parcerias da União (Sigpar), usando machine learning e big data para oferecer análises acessíveis e intuitivas.

RM-Em termos de uso de indicadores, você vê alguma diferença significativa entre os governos federal, estadual e municipal? Tem algum exemplo positivo?

WR- Sim, há diferenças significativas no uso de indicadores entre os governos federal, estadual e municipal, principalmente em função dos recursos, capacidade técnica e acesso a tecnologias de coleta e análise de dados disponíveis em cada nível.

No governo federal, há maior disponibilidade de recursos e infraestrutura, o que permite o uso de indicadores mais sofisticados e abrangentes para monitorar políticas públicas em nível nacional. Um exemplo positivo é o uso de sistemas integrados, como o Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde (SIOPS) e o Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (SIAFI), que permitem uma visão consolidada e detalhada das despesas e investimentos. Esses sistemas possibilitam uma análise de impacto mais precisa e a tomada de decisões baseadas em evidências, algo que tende a aumentar a eficiência e a transparência das políticas públicas.

Já em nível estadual, há um esforço para acompanhar e adaptar as diretrizes federais, mas com autonomia para desenvolver indicadores que reflitam as necessidades locais. Estados como São Paulo têm investido na criação de paineis de monitoramento que usam dados de setores como segurança pública, saúde e educação para avaliar a eficiência das políticas e ajustar estratégias. Esse tipo de iniciativa exemplifica a capacidade dos estados de utilizar indicadores para gestão baseada em resultados, mesmo que enfrentam desafios relacionados à interoperabilidade e à integração com sistemas federais e municipais.

No caso dos municípios, especialmente os de menor porte, a limitação de recursos e capacitação técnica restringe o uso de indicadores complexos. Muitos dependem de sistemas estaduais e federais para monitoramento e relatórios. Contudo, há exemplos positivos: cidades como Curitiba e Recife desenvolveram indicadores locais de sustentabilidade e mobilidade urbana, utilizando dados de sensores, aplicativos de transporte e feedback da população. Essas cidades criaram soluções que, mesmo com menos recursos, conseguiram adaptar o uso de indicadores para melhorar serviços urbanos e planejar o crescimento sustentável.

RM- Quais são os maiores desafios no tratamento e análise dos dados coletados pelo governo? Você acredita que podemos superá-los no médio prazo?

WR- Os maiores desafios no tratamento e análise dos dados coletados pelo governo incluem a fragmentação dos sistemas de dados, a baixa qualidade e padronização dos dados, a falta de interoperabilidade entre sistemas governamentais e a escassez de profissionais capacitados em análise de dados no setor público. Esses desafios dificultam o uso efetivo dos dados para tomada de decisão baseada em evidências e para a geração de valor público.

Muitas vezes, cada órgão ou setor possui seus próprios sistemas de coleta e armazenamento de dados, o que leva a uma fragmentação que impede uma visão integrada das informações. Essa falta de coesão dificulta a análise de dados interinstitucional e o desenvolvimento de políticas mais abrangentes e coordenadas.

Problemas como duplicação, inconsistência e dados desatualizados são comuns. Dados coletados em diferentes formatos e com diferentes padrões tornam difícil sua análise e limitam a precisão das informações.

Os sistemas de dados utilizados por diferentes níveis de governo e órgãos frequentemente não se comunicam entre si. Isso impede o compartilhamento de dados e a criação de um ecossistema unificado, essencial para análises mais completas e integradas.

No setor público, há uma falta de profissionais com habilidades avançadas em ciência de dados, estatística e análise de políticas baseadas em dados. Esse déficit limita a capacidade do governo de extrair insights úteis dos dados e aplicar análises preditivas e outras técnicas avançadas.

Além desses desafios, questões de privacidade e segurança também são críticas, especialmente devido ao volume de dados pessoais sensíveis sob responsabilidade do governo. É fundamental que haja um equilíbrio entre o uso de dados para inovação e a proteção da privacidade dos cidadãos, com práticas e normas de segurança robustas.

Superar esses desafios no médio prazo é possível, mas exige esforços coordenados e investimentos significativos em várias áreas. Adotar uma governança de dados estruturada e centralizada pode ajudar a coordenar esforços entre diferentes órgãos e níveis de governo, promovendo a padronização e a interoperabilidade. A boa governança de dados permite aproveitar os dados como um ativo estratégico, promovendo o compartilhamento e a reusabilidade das informações.

Investir em tecnologias de integração de sistemas e em plataformas unificadas de dados pode melhorar a interoperabilidade. Soluções como o uso de APIs e data lakes facilitam o compartilhamento seguro de dados entre órgãos e até com a sociedade.

Investir na capacitação de servidores em áreas de ciência de dados e análise estatística, e promover a atração e retenção de talentos com essas habilidades, é essencial para superar o déficit atual e para aprimorar o uso dos dados na formulação de políticas.

Definir padrões de coleta e armazenamento e estabelecer práticas para a limpeza e validação dos dados ajudará a resolver problemas de qualidade. A criação de frameworks e normas de qualidade de dados pode proporcionar maior confiabilidade e consistência nas informações coletadas.

Essas ações exigem uma transformação digital robusta e bem planejada no setor público, mas, com a evolução das tecnologias e o crescente entendimento da importância dos dados para a formulação de políticas, é possível que, no médio prazo, o governo consiga avançar significativamente na superação desses desafios.

RM- Vejo alguns órgãos tentando evoluir na gestão com base em dados. Criam dezenas de indicadores e fazem a divulgação, mas poucas informações de qualidade são geradas. Você acredita que, no caso de indicadores, “menos é mais” ou avalia que o ideal é ter o máximo de indicadores possível?

WR- No caso de indicadores, o princípio de que “menos é mais” tende a ser mais eficaz. A criação de um grande número de indicadores pode, paradoxalmente, gerar confusão e diluir o foco nas informações mais importantes, o que compromete a qualidade da análise e a tomada de decisão. Indicadores devem ser selecionados de forma estratégica, priorizando a qualidade sobre a quantidade, para que possam fornecer uma visão clara e útil sobre o desempenho e o impacto das políticas públicas.

Indicadores bem escolhidos são aqueles que são relevantes, acionáveis e capazes de refletir os resultados que realmente importam para a organização. Quando se cria um excesso de indicadores, há o risco de dispersão dos esforços e até mesmo de direcionar recursos e atenções para métricas que não trazem valor real para a gestão. Além disso, manter e analisar muitos indicadores consome tempo e recursos que poderiam ser direcionados para o aprofundamento de análises em áreas prioritárias.

Para uma gestão pública orientada por dados, é fundamental estabelecer indicadores alinhados aos objetivos estratégicos da organização, integrando-os a um sistema de governança de dados que favoreça o compartilhamento e a análise de informações de maneira efetiva. Esse enfoque ajuda a reduzir o excesso de indicadores e aumenta a clareza sobre os resultados esperados e o progresso alcançado.

Ter o máximo de indicadores pode ser útil em contextos específicos, como em programas de grande escala ou em áreas com alta complexidade e múltiplas variáveis. Nesses casos, os indicadores adicionais podem apoiar análises detalhadas e ajudar a entender melhor os fatores que influenciam os resultados. No entanto, mesmo nesses cenários, é essencial identificar quais indicadores são críticos para o acompanhamento e quais são complementares, a fim de evitar sobrecarga informacional e concentrar a atenção no que realmente importa.

Portanto, um conjunto menor e mais focado de indicadores, que realmente capture as dimensões essenciais do desempenho e dos objetivos da instituição, é geralmente mais eficaz do que uma multiplicidade de indicadores. Isso possibilita uma gestão baseada em dados mais objetiva, ágil e centrada em resultados relevantes.

RM-Um dos cursos que você ministra trata da importância dos indicadores de desempenho para a Governança e Gestão por resultados. Quais as dúvidas e dificuldades mais comuns dos alunos sobre essa temática?

WR- Os alunos frequentemente apresentam dúvidas e dificuldades relacionadas aos indicadores de desempenho para a Governança e Gestão por Resultados, que refletem os desafios práticos dessa temática. Um dos principais questionamentos está na escolha e relevância dos indicadores: eles querem saber quais critérios adotar para selecionar os indicadores mais importantes, evitando dados que não geram valor para a organização. Além disso, muitos têm dificuldades para definir metas claras e mensuráveis para cada indicador, questionando como estabelecer parâmetros de sucesso realistas que realmente contribuam para a gestão.

Outra área de dúvida comum é a interpretação e análise dos dados. Muitos alunos relatam insegurança em transformar as informações coletadas em insights úteis para a tomada de decisões. Além disso, há uma dificuldade em alinhar os indicadores com a estratégia organizacional, o que leva a questionamentos sobre como garantir que eles reflitam as prioridades e metas da instituição.

Os alunos também se preocupam com a frequência de monitoramento e ajustes dos indicadores, não sabendo ao certo com que periodicidade devem acompanhar os dados e em que momento ajustes nas metas ou indicadores são necessários para manter sua relevância. Por fim, a escolha de ferramentas e métodos de coleta de dados gera dúvidas, especialmente sobre como integrar essas ferramentas aos sistemas já existentes na organização.

Essas dificuldades mostram a importância de entender não só a estruturação e aplicação dos indicadores de desempenho, mas também de dominar a interpretação dos dados para impulsionar uma governança eficiente e uma gestão focada em resultados.

RM-Para finalizar, você poderia nos indicar podcasts, vídeos, artigos, livros ou publicações acadêmicas sobre a gestão de indicadores no setor público?

WR- Para quem busca aprofundar-se na gestão de indicadores no setor público, algumas leituras e recursos são recomendados, começando pelo artigo clássico de Robert Behn, “Why Measure Performance? Different Purposes Require Different Measures”, publicado na Public Administration Review. Neste artigo, Behn discute a importância de definir diferentes propósitos ao medir o desempenho, especialmente no setor público, onde indicadores servem a finalidades como aprendizado, controle e avaliação, cada qual exigindo abordagens distintas. O artigo está disponível no site da Harvard Kennedy School e pode ser acessado em Why Measure Performance?.

Outro material relevante é o “Guia referencial para construção e análise de indicadores” de Leandro Oliveira Bahia, publicado pela Escola Nacional de Administração Pública (Enap) em 2021. Este guia oferece uma abordagem prática para a criação e análise de indicadores, com metodologias específicas para o setor público brasileiro, buscando aumentar a transparência e a eficácia nas práticas de gestão. Esse material é especialmente útil para gestores e técnicos e está disponível no repositório da Enap em Guia referencial para construção e análise de indicadores.

Por fim, o livro “Como Mensurar Qualquer Coisa. Encontrando o Valor do que É Intangível” de Douglas W. Hubbard explora técnicas para mensurar aspectos considerados intangíveis, que são desafiadores de quantificar, mas essenciais na administração pública e na gestão em geral. As ideias de Hubbard são particularmente úteis para quem quer abordar a medição de elementos menos tangíveis no setor público.

Essas obras abrangem desde fundamentos teóricos até guias práticos para a aplicação de indicadores, oferecendo uma visão completa e aprofundada para quem deseja aprimorar a gestão por resultados na administração pública.

 

BEHN, Robert. Why Measure Performance? Different Purposes Require Different Measures. Public Administration Review, v. 63, n. 5, p. 586-606, set./out. 2003. Disponível em: https://www.hks.harvard.edu/publications/why-measure-performance-different-purposes-require-different-measures. Acesso em: 10 nov. 2024.

BAHIA, Leandro Oliveira. Guia referencial para construção e análise de indicadores. Brasília: Escola Nacional de Administração Pública (Enap), 2021. Disponível em: http://repositorio.enap.gov.br/handle/1/6154. Acesso em: 10 nov. 2024.

HUBBARD, Douglas W. Como Mensurar Qualquer Coisa. Encontrando o Valor do que É Intangível. 2. ed. Hoboken: Wiley, 2010. Disponível em: https://hubbardresearch.com/shop/measure-anything-workbook-finding-value-intangibles-business/. Acesso em: 10 nov. 2024.

 

Weskley Rodrigues-Mestre em Administração Pública (FGV-Ebape). Especialista em Administração Pública e Contabilidade Pública. Graduado em Administração com foco em Comércio Exterior. Servidor público desde 2010. Possui certificação internacional em Gestão de Processos de Negócios CBPP® pela ABPMP®. Professor e palestrante na área de Gestão Pública. Professor na área de Administração Geral e Pública em diversas instituições: ABOP, EBRADI, ESMPU, Enap, Gran Cursos, IBGP. Ocupou o cargo de Secretário de Gestão Estratégica do Conselho Nacional do Ministério Público de 2015 a 2019. Assessor na Secretaria de Gestão do Ministério da Economia de 2019 a 2022. Assessor na Secretaria de Gestão e Inovação do Ministério da Gestão e da Inovação em serviços públicos de 2022 a 2024. Chefe do Núcleo de Ciência de Dados do Conselho Nacional do Ministério Público. Email para contato: [email protected]

Rafael Mota-Analista Administrativo da ANTAQ. É autor, consultor e palestrante, com mais de 20 anos de experiência em compras públicas. Pós graduado em Gestão Pública e em Business Intelligence & Analytics. Certificado em Liderança pela Dale Carnegie e em Governança, Riscos e Compliance pela KPMG. Foi Gerente de Licitações e Contratos da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) entre 2018 e 2021, período no qual elevou a Governança e Gestão de Licitações e Contratos ao 1º lugar dentre as Agências Reguladoras e 13º lugar geral no índice de governança e gestão medido pelo TCU (Igov). Foi Pregoeiro, Presidente da CPL, Secretário-Substituto de Planejamento Estratégico e Coordenador-Substituto de Cadastro e Pagamento. Na iniciativa privada atuou como auditor da PwC, maior empresa de auditoria do mundo. Email para contato: [email protected]

[1] KAPLAN, R. S.; NORTON, D. P. The Balanced Scorecard–Measures that drive performance. Harvard Business Review, 1992. Disponível em: https://hbr.org/1992/01/the-balanced-scorecard-measures-that-drive-performance-2. Acesso em: 10 nov. 2024.

[2] GROVE, Andrew S. Gestão de alta performance: tudo o que um gestor precisa saber para gerenciar equipes e manter o foco em resultados. Tradução de Cristina Yamagami. São Paulo: Benvirá, 2020, pags. 44 a 47. Disponível em: https://www.academia.edu/94015452/Gest%C3%A3o_de_Alta_Performance_Andrew_S_Grove. Acesso em: 10 nov. 2024.

[3] TUSHMAN, M. L.; O’REILLY, C. A. III. Ambidextrous organizations: Managing evolutionary and revolutionary change. California Management Review, 1996. Disponível em: https://web.mit.edu/curhan/www/docs/Articles/15341_Readings/Organizational_Learning_and_Change/Tushman_&_OReilly_1996_Ambidextrous_Organizations.pdf. Acesso em: 10 nov. 2024.

[4] Art. 37. § 16. Os órgãos e entidades da administração pública, individual ou conjuntamente, devem realizar avaliação das políticas públicas, inclusive com divulgação do objeto a ser avaliado e dos resultados alcançados, na forma da lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 109, de 2021)

[5] OECD. The Path to Becoming a Data-Driven Public Sector. OECD Publishing, 2020. Disponível em: https://www.oecd.org/en/publications/the-path-to-becoming-a-data-driven-public-sector_059814a7-en.html. Acesso em: 10 nov. 2024.

[6] https://infogov.enap.gov.br/home